O ABC da morte
Uma amiga me pediu para analisar os 26 curtas que compõe a antologia "O ABC da morte" e aqui está:
(Aviso, esse texto tem spoilers, já que não dá para fazer uma analise completa sem contar o desfecho das histórias).
A partir da letra "B" eu terei de traduzir os títulos entre parenteses, pois a palavra que dá o nome está em inglês.
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A é de Apocalipse:
O curta que dura um pouco mais de 3 minutos tem uma abordagem meio pastelão macabra, enquanto a gente vê uma mulher tentar dar cabo do marido de formas nada convencionais (facadas e depois um frigideirada na cabeça) e por fim, ela revela que vem envenenando-o há meses. Mas poucos segundos antes do curta acabar,
a gente fica sabendo o motivo. O mundo está literalmente acabando e ela queria poupá-lo da dor do momento em que a Terra explodisse. É um curta divertido, mas meio seco, por conta da duração curta.
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B é de Big foot (Pé Grande):
Um rapaz quer transar com a namorada, mas ele está tomando conta da irmã caçula, que acorda e diz que está sem sono. Então os dois idiotas resolvem contar uma
história de terror para a menina, para que ela vá dormir logo e os deixe em paz. Eles falam sobre o homem das neves, um monstro que se alimenta de corações de crianças (literal, não figurativamente) e que vem devorar crianças teimosas que não vão para a cama no horário mandado.
Bom, aparece alguma coisa no apartamento que mata o rapaz e a namorada. Mas não pega a menininha, que está debaixo das cobertas contando carneirinhos.
Eu interpretei essa história como "Nunca minta para as crianças, pois isso pode virar contra você". É uma narrativa simples e efetiva, sem muito sangue/tripas, mas que entrega bem o que prometeu.
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C é de Ciclo:
A história começa com um rapaz lavando uma mancha de sangue no quintal enquanto sua namorada o chama. Em seguida corta para ele na cama, dormindo ao lado da namorada e então a moça o acorda, dizendo que ouviu um barulho no andar de baixo. Ele vai checar, e acaba caindo em uma espécie de toca de coelho no quintal. Quando consegue voltar e entra na casa, se vê deitado ao lado da namorada, dormindo e então,
corre para o andar de baixo e se esconde na garagem. Quando vê seu outro eu sair e ir em direção ao buraco de coelho, o que voltou de lá o ataca e o mata. O curta então volta para a cena inicial, com o personagem lavando a mancha de sangue enquanto sua namorada o chama.
Pelo que eu entendi, ao cair na tal toca de coelho, o personagem entrou em um ciclo vicioso de repetição, em que voltou alguns minutos no passado, tendo agora dois dele na mesma linha do tempo. E claro, como já diziam em Highlander, "Só pode existir um". Dai ele mata sua "cópia"? Mas será que era mesmo uma cópia, se ele que estava dormindo era o original e o ele que voltou também era o original...
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D é de Dog Fight (Briga de cachorro):
Começa com closes de um lutador de boxe, batendo a cabeça contra a tela de proteção do rigue e depois colocando as luvas de boxeador nas mãos. Vemos então o close em um cartaz de "cão perdido"
A tal luta não será de homem contra homem, mas sim de um homem contra um cachorro e após algumas mordidas do bicho no cara, o boxeador revida em uma cena perturbadora e dá uma mordida no cachorro.
Em certo momento a gente vê uma criancinha pulando e vibrando (dentro do contexto do curta) com a tal luta.
Então tem um plot twist quando o boxeador chama o cachorro pelo nome, "Buddy" e ficamos sabendo que o cachorro na verdade era dele. O bicho para de atacar e senta quieto ao lado do homem.
O cachorro então ataca o homem que o havia trazido para a luta e a cena corta para o boxeador saindo do ringue e imagens do outro homem ensanguentado e por fim, o boxeador esmagando a cabeça do outro com uma coisa pesada.
Esse é um dos que eu não gosto, (e acho que vou repetir essa frase mais algumas vezes durante esta analise), por vários motivos mas o principal é a instigação a crueldade contra animais, mesmo sabendo que o bicho não foi ferido durante as filmagens, só a ideia já é repulsiva.
O cachorro do curta é uma fofura e a gente vê que é atuação no momento em que o bicho "morde" a jugular do boxeador. Tudo o que o cachorro fez foi deitar a cabeça em cima do pescoço do cara. Ainda assim, a ideia do curta é perturbadora.
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E é de Extermínar:
Eu gosto da simplicidade desse segmento. É sobre aranhas, então se você tem aracnofobia, recomendo pular ele se estiver vendo a antologia.
A primeira cena que a gente vê é um close e distanciamento de uma aranha vermelha e preta na parede de um cômodo. Então entra em cena o protagonista, um homem que trabalha em casa, no computador.
Ele vê a aranha (e ela também o vê e a gente vê tudo através dos olhos do aracnídeo). Ele tenta matá-la com uma revista, mas a aranha pula para longe (me pergunto se era do tipo armadora, porque se fosse, o personagem já teria ido há tempos).
O horror de verdade começa quando a aranha pula na parte de trás do pescoço do cara e o morde. Então nós temos uma série de cenas acompanhando os dias da semana, enquanto a aranha espreita o homem.
No sábado o rosto do cara já exibe algumas brotoejas e feridas bem sérias, mas claro, ele não se deu conta disso.
No Domingo ele finalmente consegue acabar com a tal aranha, acertando ela com uma revista, mas então, seu ouvido, que já vinha incomodando há alguns dias, chega ao ápice da dor e então... milhares de arainhas começam a sair da sua orelha.
O conto se inspirou na lenda urbana de bichos que rastejam para dentro do ouvido da pessoa e botam ovos lá. É uma lenda urbana, não existe comprovação científica disso, mas ainda assim, dá um medinho básico - especialmente se você tem pavor de aranhas.
É uma narrativa limpa e rápida, precisa e eficiente que entrega o que prometeu de uma forma que satisfaz quem está assistindo.
Curiosidade: Este curta foi dirigido pela atriz Angela Bettis (May, obsessão assassina).
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F é de Fart (Peido):
O humor japonês é uma coisa muito peculiar e nem sempre isso quer dizer algo bom. Nesse curta aqui, a gente vê, como eu posso dizer? Não tem como ser sutil, uma colegial que mata pessoas com seus peidos. E o pior, o curta ainda quer fazer uma abordagem romântica lésbica!
Tem nudez desnecessária e fora de contexto e muitas, eu disse muitas cenas nojentas envolvendo flatulência. Lembro que da primeira vez que eu vi, eu já não gostei desse curta, caramba, tinha tantas coisas melhores com a letra "F" para usarem, mas não, tinham de fazer um curta sobre puns!
Não dá pra falar muito desse aqui, porque ele se resume em cenas de uma personagem soltando ar fedido na cara da outra e puns violentos o bastante para "destruir o planeta".
E sem falar que os tais puns são totalmente feitos em CGI e tem uma coloração amarela que mais lembra gás mostarda do que gases humanos.
Sem dúvida, junto com mais uns outros 2 curtas, esse aqui é um dos quais eu não gosto nenhum pouquinho.
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G é de Gravidade:
Essa aqui foi feita com uma câmera Gopro, ou seja, do ponto de vista da filmagem, nós somos o protagonista, pois vemos o que ele vê. E estamos indo surfar!
O curta não tem muito desenvolvimento, o protagonista começa a surfar, desequilibra da prancha e cai, se afogando enquanto a prancha continua lá no mar, boiando em pé.
Acho esse aqui (e um outro curta que está mais pra frente) extremamente preguiçosos. O diretor nem se esforçou em pensar um pouco no roteiro antes de desenvolver uma história tão rasa e vazia quanto "cair da prancha no mar e se afogar", pois a grande maioria dos diretores da antologia, criaram formas absurdas e únicas de morte para suas narrativas. Mas não é o caso desse aqui.
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H é de Hidroeletrocução:
Esse aqui, eu tenho certeza que o diretor tem um pezinho no fandom furry.
Os personagens são animais antropomórficos (com comportamentos e aparências humanas). A história começa com um cachorro aviador bebendo em um cabaré enquanto assiste ao show burlesco de uma gata sensual. A coisa vai bem, até que a gata revela ser uma infiltrada dos n4zi e ataca o cachorro, que é um piloto de guerra inglês.
Tem uma cena em que a gata coloca uma armadilha dolorosa no meio das pernas do cachorro e as reações exageradas e cartunescas do personagem lembram aquelas animações de 1930 da Warner Bros, com olhos saltando das órbitas e fumaça saindo das orelhas. A gata quer hidroeletrocutar o cachorro.
E está quase conseguindo, mas no ultimo minuto o cachorro consegue inverter a situação e joga a gata no tacho de água com fios elétricos, puxando a alavanca e dando cabo dela.
O fato de a gata ter peitos enormes e mamilos salientes que ficam visíveis depois que ela tira a blusa (não sei até agora porque), além da sequência em que a cara dela derrete por completo, com certeza seriam motivo de ira dos pais se esse curta passasse na tevê entre "Pernalonga" e "Pica-Pau".
A abordagem ridícula e exagerada do curta, com toda uma dinâmica de cartoon antigo, dá certo desconforto, mais pelo fato das criaturas que estão protagonizando o curta terem traços de aparência e comportamento humano. É um verdadeiro desfile de bizarrices.
E falando nisso, só há uma palavra que me vem a mente quando penso nesse segmento da antologia, e é "Bizarro".
É uma representação realista do fenômeno do Uncanny Valley (o vale da estranheza), onde nos deparamos com algo que parece humano, mas é estranho demais para ser classficado assim.
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I é de Ingrown (Encravado):
Neste aqui a gente vê um homem sentado sobre a tampa da privada, encarando uma cortina de banheiro e quando ele a puxa, descobrimos que tem uma mulher dentro da banheira, amarrada e amordaçada. Ela luta e tenta gritar sem sucesso, então o homem lhe aplica uma injeção, que a faz começar a sufocar. Em off temos uma narração com voz de mulher falando sobre como ela era, ela foi e ela não é mais. Após o conteúdo da seringa fazer efeito e a mulher desfalecer, temos um close em dois pares de pantufas e então, na aliança no dedo anelar dela, cuja mão cai mole e sem vida para fora da banheira.
Não há muito espaço para narrativas nesse curta, pois só tem duas interpretações:
1. Ela foi vítma de um serial killer, já que em certo momento diz que não se lembra como chegou ali.
2. Ela foi morta pelo marido, as dicas estão nas pantufas, um par feminino e um masculino e a aliança.
De qualquer forma, esse é um dos segmentos mais proximos da realidade na antologia e é exatamente por isso que incomoda, pois pode acontecer com qualquer pessoa que conhecemos.
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J é de Jidai-geki (filme de samurai):
E temos outros representante japonês.
Eu não entendo porque eles tentam usar de comédia porca para fazer curtas de horror, sendo que existem ótimos filmes de horror japonês que não se apoiam nessa desculpa ridícula.
Nesse aqui o foco são caretas ridículas (feitas com maquiagem prática porque é humanamente impossível fazer aquelas expressões na vida real), algumas das caretas beiram um body horror tosco e mal feito.
Antes que alguém ache que estou perseguindo os diretores japoneses da antologia, quero deixar claro que gosto de várias produções japonesas, o problema aqui foi que os dois diretores que vimos até agora, optaram por usar do recurso comédia ridícula ao invés de pegarem algo mais na linha do perturbador/grotesco.
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K é de Klutz (desastrado):
Chegamos a primeira das duas animações que fazem parte da antologia. Esta aqui é no estilo clássico e começa com uma moça indo usar o banheiro, durante uma festa. Ao que tudo indica ela está constipada, até que finalmente... sai alguma coisa.
Quando ela vai dar descarga, a "coisa" (vulgo cocô) não só não quer descer pelo cano, como resmunga quando ela tenta dar a descarga mais uma vez.
O resto do curta é a personagem tentando dar cabo do trocinho (que pasmem, quer voltar pro lugar de onde saiu).
No fim, o trocinho cai do teto e como a personagem está de quatro procurando ele, o coisinho entra de novo lá, é, naquele lugar de onde ele saiu há alguns minutos - e isso acaba matando a personagem.
É nojento? sim, não vou mentir, é sim, mas a dinâmica entre ela e o toletinho vivo é engraçada, beirando meio o ridiculo e pelo fato de ser uma animação, a gente acaba relevando algumas coisas que se tivesse sido feito com atores de verdade, não daria para ignorar.
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L é de Libido:
Tá, eu preciso dizer que esse aqui é um dos dois únicos curtas que me deixou muito desconfortável e não foi nem pelo suposto gore, mas pelas situações doentias as quais os personagens são submetidos.
A história começa em uma bizarra competição de masturbação, em que aquele que gozar primeiro ganha. Dois homens foram desmaiados e levados até o lugar sem seu consentimento, e no salão, há uma série de pessoas mascaradas assistindo a tudo.
No começo, os dois homens, que estão amarrados fortemente à cadeiras, são apresentados para uma moça muito bonita, que está nua e fica claro que a menos que eles se masturbem, não poderão ser libertados. Este é o estagio 01.
O perdedor morre sendo empalado com uma lança que está instalada embaixo da cadeira. O protagonista, que é o personagem nos apresentado primeiro, sobrevive as etapas, enquanto seus "concorrentes" são empalados vivos pela lança na cadeira que está ao lado da sua.
Dos estágios 01 a 11 temos apenas moças bonitas nuas, a coisa começa a ficar doentia a partir do número 12. Sobe no palco uma garota em uma cadeira de rodas, usando pescoceira clínica e uma prótese para uma das pernas, a qual ela retira e começa a usar para se auto-estimular.
Só que quando a responsável por eliminar os perdedores, aperta o botão, a lança erra alguns centimetros e além de empalar o homem, também trespassa o queixod ela. - eu fiquei feliz com isso, a personagem é uma sádica escrota.
Mas o show tem de continuar e eles arrumam um substituto. Durante todo o tempo, os creepies de máscara continuam observando tudo em silêncio, no melhor estilo audiência de filme snuff.
No estágio 13 eu já estava passando mal, pois entra no palco um menininho com pouco mais de oito anos. Ele deita numa cama de hospital montada no centro do espaço e então surge um homem que começa a se despir. E apesar de não vermos nada, podemos ouvir os sons e ter um close da mão do homem sobre a guarda da cama, são o suficiente para embrulhar o estômago (pontos extras pelas expressões doentias do competidor ao lado do protagonista, que está lutando para não usar aquele show de horrores para se estimular, apesar de saber que se não o fizer, ele será morto).
O protagonista acaba vomitando e desmaia. Quando ele acorda, tem uma mulher muito bonita sentada sobre ele, mas ao olhar para o lado, ele vê outros dois competidores amarrados nas cadeiras, se masturbando enquanto o assistem interagindo com a moça. Ele se tornou parte dos testes.
É quando a moça, ainda sobre ele, pede a alguém uma coisa que lhe é entregue, uma motosserra, ela começa a cortá-lo vivo, enquanto os esquisitos mascarados, com certeza ricos escrotos, vão a loucura com o show de bizarrice doentia.
Uma luz vermelha acende e uma campainha toca. O curta acaba.
Esse aqui me incomoda de várias formas, primeiro pela coação dos personagens a fazerem algo sexual em troca de sobreviverem, em seguida, as bizarrices que começam a aparecer a partir do nível 12, a moça com a protese de perna é repulsivo, mas a mensão ao abuso do garotinho é ainda
mais horrível e por fim, a sequência em que o protagonista se encontra que é digna de um filme snuff. Este é sem dúvida alguma um dos curtas mais doentios da antologia, e não é pela parte do gore, como eu disse, mas sim pela depravação sexual forçada e como isso é vendido como uma diversão para possíveis pessoas ricas.
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M é de Miscarrige (aborto espostâneo):
Detesto esse curta, detesto tanto que nem sei dizer o quanto.
Dirigido pelo Ty West (x - A marca da morte, Pearl) o curta se resume a uma mulher indo ao banheiro, sofrendo um aborto expontâneo e dando descarga nos restos do feto.
Tá bem que para algumas pessoas, um aborto expontâneo (talvez até provocado por medicação) pode não ser uma grande coisa, mas a grande maioria das pessoas gestantes que sofrem um aborto expontâneo estavam querendo aquela gestação e por isso eu achei esse curta um enorme desrepeito com essas pessoas, já que na história, a situação é tratada como algo banal, como uma evacuação intestinal.
Um desrespeito e uma falta de tato enorme com a situação. Poderia ter feito o curta sobre esse assunto? Sim! e havia tantas possibilidades que não envolvessem banalizar
uma situação tão traumática e dolorosa. Eu não gosto dos filmes do Ty West, não acho ele um bom diretor, nem desde o primeiro filme dele "A casa do diabo", em que de 1h30 de filme, toda a parte de horror/sobrenatural só apareceu nos últimos 15 minutos de filme. (essa é a minha opinião pessoal, se você gosta dos filmes dele, tá tudo bem, mas PARA MIM, o homem não é assim tão bom diretor).
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N é de Núpcias:
Um casal de namorados que tem discutido bastante, arruma um passarinho que fala, para tentar trazer alguma alegria para a casa deles. E o bichinho é esperto e fala tudo.
O rapaz então coloca uma caixinha de alianças sobre a bancada e o passarinho pega o anel e entrega para a moça, enquanto repete "Casa comigo?" - teria sido um curta romantico fofo, se essa aqui nãofosse uma antologia de horror.
Lembra que eu disse que o bichinho falava tudo? Infelizmente, É tudo mesmo. o passarinho repete coisas que a amante dele disse enquanto a outra moça não estava em casa. Inclusive falas ditas em momentos bem... específicos. O curta termina com a moça esfaqueando o cara (apesar de a gente só ver o sangue espirrando na lente, enquanto o passarinho continua imitando os sons da amante).
E a moral da história é: se você tem um passaro que fala, não faça coisinhas pervertidas com outra na frente dele. Esse curta entra na mesma categoria de "Apocalipse" e "ciclo", é divertidinho, mas nada impactante.
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O é de Orgasmo:
Esse aqui o diretor tentou fazer uma coisa meio diferentona e cult, mas só ficou chato pra caramba. Um homem faz sexo oral em uma mulher, ela espele uma bolha de sabão multicolorida pela boca. Uma boneca barbie é queimada com um cigarro. Mais bolhas de sabão. Um cigarro estoura uma bolha de sabão. Algo que parece uma faca golpeia a mulher e ao que tudo indica, ela morreu.
Não tenho muito o que dizer desse curta, é chato e metido a intelectual mas não passa de um monte de imagens confusas que não significam nada.
Curiosidade: Este curta foi dirigido por Helène Cattet, que junto de Angela Bettis, era a única outra diretora mulher participando da antologia.
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P é de Pressão:
Junto da letra "L" esse aqui me deu pesadelos da primeira vez que eu vi (e vai me dar de novo agora). O curta apresenta uma prostituta que está tentando conseguir dinheiro para comprar uma bicicleta de aniversário para o filho pequeno. Certo dia aparece um estranho homem que lhe oferece um valor absurdo para ela fazer uma sessão de crushing (fetiche em que se esmaga coisas com botas de salto). Relutante, ela aceita, no começo
são apenas coisas inanimadas, frutas, objetos, mas as coisas vão ficando piores e logo ela tem de fazer isso em um gatinho. - foi ai que eu desisti de ver o curta até o fim - pulei a cena em questão, mesmo sabendo que não é real, só a menção de machucar um ser vivo em troca de prazer sexual me enojou tanto que eu tive de pular a cena. No fim a moça consegue o dinheiro (ou seja, ela fez) e mostra o filho feliz com a bicicleta.
Assim como em "Libido" meu problema com esse curta é a manipulação, agora financeira, de alguém para obter em troca um tipo muito específico e doentio de prazer sexual. Ela foi seduzida pelo valor alto em dinheiro para inicialmente, fazer algo que não traria risco nenhum. Mas no fim, enquanto o menino anda de bicicleta, a gente vê no rosto da moça que algo morreu dentro dela.
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Q de Quack (som que o pato faz):
Aqui ficou óbvio que os diretores tinham uma preguiça gigantesca, pois com "Q" existem outras palavras melhores que "Quack". "Queen" por exemplo, "Rainha", em que poderiam ter feito algo medieval ou até mesmo atual.
Mas enfim, o curta é sobre os dois idiotas tentando fazer o curta e colocando o pato em situações perigosas, para no final o bicho não só sair vivo e bem, como também "matar" os dois diretores.
Mediano e preguiçoso.
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R de Removido:
Esse aqui é sem dúvida um dos curtas mais viajados e interessantes da antologia, dirigido pelo Srdjan Spasojevic (que mais tarde viria dirigir o polêmico e superestimado "A serbian film") aqui a gente vê um lado mais artístico e criativo do diretor.
Em um hospital sujo e decadente, há um paciente amarrado que exibe lacerações grandes na pele, ele está autografando o que parece ser uma pilha de dvds.
Vemos então as costas do paciente, que é recoberta por queimaduras que sangram,enquanto um médico e uma enfermeira removerem tiras da pele queimada, em uma sequência explícita e bem impactante, onde o body horror impera por longos minutos de sangue e pele cortada.
As tiras removidas do corpo do homem, são então levadas a um quarto escuro, onde passam por algo parecido com o processo de revelação fotográfica e então, saem como tiras de rolo de filme cinematográfico, limpas e projetáveis.
O homem então, em uma cadeira de rodas, é exposto para a mídia, "protegido" dentro de uma enorme jaula de metal, mas mesmo assim as pessoas conseguem invadir a jaula e tocá-lo, fotografá-lo e assediá-lo de uma forma doentia, enquanto um som de apito ensurdecedor soa no fundo da cena.
Temos então mais uma sequencia cirurgica para remover tiras de pele das costas do homem, mas num momento de descuido do médico, o homem, que está com ambos os pulsos algemados, enforca o outro homem com as próprias correntes e foge. Em momento algum do curta nós vemos o rosto do homem ou sabemos seu nome e nem ouvimos
qualquer diálogo.
O homem encontra um revólver no armário, onde também podemos ver um uniforme de alta patente do exército. E antes disso, ele tira do próprio corpo uma bala feita de carne, que coloca então no tambor da arma. No corredor do hospital, há dois homens que parecem agentes especiais do governo e ao que tudo indica, estavam lá para não deixar que o paciente fugisse. O homem mata os dois e um médico que tenta impedi-lo de sair, com brutalidade usando objetos que trouxe consigo.
A única que sobrevive é a enfermeira, que sempre o tratou bem. O homem sai do hospital e dá de cara com uma ferrovia desativada, ele então começa a empurrar um dos trens, enquanto a bolsa de sangue que ainda está ligada a ele pelo braço, arrasta atrás, escorrendo sangue pelo chão.
Mas ele não vai muito longe e desmaia. Começa a cair uma chuva vermelha sobre o lugar e tudo vai se cobrindo de sangue até que algumas gotas espeças cobrem a tela.
O curta acaba.
É difícil entender exatamente a mensagem desse curta, pode ser sobre a exploração dos artistas pela mídia, pode ser uma metáfora para a situação da Sérvia na época que o diretor ainda era jovem, pode ser tantas coisas. Mas eu sei de uma coisa, é um curta bastante perturbador. Quando vi "Serbian film" senti falta disso, dessa singularidade estranha e desconfortável e das possíveis mensagens sublineares que esse curta transmite.
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S é de Speed (Velocidade)
Esse aqui foi outro que o diretor tento fugir da fórmula e ficou chato.
O curta começa com duas mulheres fugindo, uma delas está armada e a outra, algemada, enquanto um homem muito estranho vestido como um personagem ladrão da idade média
as persegue. Quase no fim do curta fica claro que tudo o que a gente viu não passou de uma viagem causada por heroína que uma das personagens está se injetando (e pela qual a outra morreu de overdose).
O curta é meio chato, tenta imitar o estilo Tarantino de cinema, cheio de caras e bocas e frases de efeito fodonas (que só são muito vergonha alheia mesmo), da primeira vez que eu vi, acabei pulando pro final porque a narrativa estava ficando muito chata.
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T é de Toilet (Toalete):
E chegamos na segunda animação dessa antologia, agora feita em claymation (animação stop motion com massa de modelar), O curta começa com um close de um peniquinho infantil, que está na lata do lixo. A história fala de um menino que tem medo do vaso sanitário,pois acha que ele vai devorá-lo (e o garoto não está errado, o troço come gente mesmo!).
Eu preciso abrir um parenteses aqui para falar do quão esquisita é a animação da boca dos personagens, parece que eles não conseguem controlar a lingua e os lábios e tudo se mistura enquanto falam. É uma animação stop motion ruim, propositalmente ruim.
A privada então solta uma gorfada de líquido verde no melhor estilo menina de "O exorcista" e em seguida após se desparafusar da parede, a peça de porcelana cria
dentes e ataca os pais do garoto, que estavam com ele no banheiro para mostrar que não havia perigo (mas havia).
E apesar de ser massinha de modelar, o diretor conseguiu entregar um gore muito melhor do que vários dos seus colegas anteriores.
O curta termina com o menino acordando gritando, tudo não passou de um pesadelo. Mas ele sente que precisa ir ao banheiro e resolve ir sem acordar os pais, que secretamente comemoram o fato do filho ter perdido o medo do banheiro, mas enquanto ele está lá, parte da caixa de descarga se solta, assustando o garoto que cai com a cabeça dentro da tampa da privada e seu pai está rindo como nunca... Até que o outro parafuso da caixa de descarga também se solta e a peça cai em cima do menino, esmagando sua cabeça. Temos um novo close do peniquinho do começo enquanto o pai grita desesperado.
Esse aqui é meio óbvio, medos infantis, descaso parental, falta de cuidado com as instalações da casa, pesadelos absurdos.
*Uma curiosidade: o diretor, Lee Hardcastle, é conhecido no meio do horror por ter produzido a perturbadora série em claymation de "Os Simpsons" chamada "Simpsons's couch gag"
em que os três valentões da escola de Bart invadem a casa dos Simpsons e os matam, um a um de forma cruel e doentia. Tem completo no youtube, mas adianto, vá ver por sua conta e risco.
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U é de Unearthed (desenterrado):
O curta começa com uma câmera em primeira pessoa, alguém está tentando sair de um lugar no subsolo e quando consegue, é fortemente atacado por dois homens usando roupa para isolamento de contaminação nuclear. O personagem através dos olhos do qual estamos vendo tudo, ataca uma mulher, bate em um homem e foge para a floresta.
O personagem é derrubado. Um homem arranca alguma coisa dele com um alicate e então alguém prega uma estaca de madeira no coração do personagem e em seguida, golpes de machado separam a cabeça do corpo (aqui já ficou meio óbvio que o tal personagem é um vampiro) isso somado aos guinchados estranhos e inumanos que ele faz.
A coisa da câmera em primeira pessoa limita bem o desenvolvimento, pois a gente só vê as coisas através da visão do personagem que escapa do que talvez fosse um caixão ou uma cova. - Eu deduzi que era um vampiro, pelas técnicas usadas para exterminá-lo, mas também podia ser um zumbi/morto-vivo. Curta mediano, não é ruim, mas também não é memorável.
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V é de Vagitus (Choro de um recém nascido):
Esse aqui quis fazer uma abordagem pós apocaliptica/futurista do mal e ficou, eh, ficou isso ai. O curta gira em torno de um grupo de exterminio enviado para encontrar uma moça e um bebê (e sim, o alvo é o bebê - mas ele não é um bebê comum). Toda a disputa e perseguição e no fim a criança era uma espécie de alienígena mutante e blablabla. Eu acho esse curta tão esquecível, tão chato.
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W é de WTF (Que merda é essa):
Assim como na letra "Q" esse aqui foi um péssimo uso de uma letra que tinha palavras bem melhores como "worm" (verme), "Wood" (floresta), "Witchcraft" (Bruxaria) e por ai vai.
Como o próprio título diz, é um verdadeiro WTF sem coerência e sem rumo. A "história" pula de um tópico sem noção para outro e termina, assim como em "Quack" com a morte dos dois criadores do curta, que antes reclamam e xingam por terem pego a letra "W" e dizem que "Não existem muitas palavras com essa letra" (eu citei três no começo desse texto e nem nasci nos EUA. Enfim, é broxante e cansativo ver como diretores idiotas tinham tanto potêncial nas mãos e jogaram tudo fora por preguiça e falta de inteligência.
E não tente jogar a carta da "metalinguagem" ou "você não entendeu a mensagem", eu entendi, entendi que pros diretores desse curta aqui qualquer coisa serviria.
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X é de XXL (extra extra grande):
Do ponto de vista do body horror esse filme é bom. Mas a forma como ele aborda a gordofobia e as tentativas quase drásticas da personagem para se adequar ao sistema cruel da sociedade, são um pouco extremas.
É a história de uma moça gorda, que sofre assédio e bullying das outras pessoas, até que ela tem a "brilhante" ideia (SQN) de fazer uma redução cirurgica caseira em seu próprio corpo.
A cena em si é bem repulsiva e explícita, mas ao mesmo tempo meio triste e incomoda, pois a que ponto de pressão essa mulher chegou para fazer esse tipo de coisas invasiva e violenta contra si própria, em uma tentativa desesperada de parecer com as modelos photoshopadas das revistas e videos da tevê?
No fim ela fica magra, na verdade, cadavérica, pois só o que resta é o esqueleto e então ela morre de choque por conta da dor de remover a seco toda a sua carne.
Ficou óbvio que a crítica nesse curta é a forma como pessoas gordas são estigmatizadas e cobradas para emagrecer - a qualquer custo - e se encaixar na sociedade. "Você não consegue emagrecer porque não quer. Só pare de comer por completo, faça cirurgia plástica, desabe de tanto se exercitar na academia, abra mão de tudo e ainda assim vai sobrar algumas sequelas, pele pendente e flacidez facial, ou seja, você nunca vai ser perfeito, nem que morra tentado".
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Y é de Youngbuck (jovem macho - animal):
A história se passa em um colégio, nos anos 1980. Os garotos estão jogando basquete enquanto o zelador, que limpa um corredor ao lado da quadra, observa os meninos por uma janela e só pela expressão no rosto do homem a gente já percebe que ele é perigoso perto daqueles meninos. Então somos apresentados a outro garoto, que será o protagonista. Ele está sentado nas arquibancadas, e quando levanta, uma poça de líquido fica no lugar em que ele estava sentado.
Do lado de fora, o zelador vê a sombra de uma estranha criatura com corpo humano e cabeça de veado, mas mais ninguém vê a criatura. Após a saida dos meninos da quadra, o zelador entra e vai até o banco úmido onde o menino estava sentado. O homem olha para o lugar com uma expressão doentia e maníaca o bastante para nos causar desconforto e por fim, para coroar os absurdos, ele lambe aquele líquido.
Então ele vê novamente a criatura com cabeça de veado e em uma breve cena fica explicado de forma subentendida não só que o zelador e o menino do banco são parentes, como também que o homem abusou
dele (em uma cena em que o velho abaixa as calças na frente do menino, enquanto ambos estão na floresta), em seguida vemos o menino, coberto de sangue, segurando uma cabeça de veado, que o homem tinha
decapitado no dia em que eles estavam na floresta. O menino enfia os chifres da cabeça do animal morto nos olhos do homem, enquanto exibe uma expressão de puro ódio e vingança. A cena é bem gore e longa.
(Mas satisfatória, afinal, o menino está livrando o mundo de um pedófilo abusador).
Por fim, em uma cena digna de um filme dos anos 80, a cabeça do zelador é arrancada pelos chifres e jogada para trás, fazendo uma cesta de basquete. O menino então veste a cabeça ensanguentada do animal
morto como uma máscara (dando a entender que ele era a tal criatura que o homem viu antes). Por fim o menino abaixa o shorts, dando a entender que vai urinar sobre a cabeça decepada do zelador.
Este aqui é sério. Apesar de ter elementos pseudo sobrenaturais, ele aborda abuso sexual de menores por pessoas em que eles confiam. No caso é o zelador da escola, que ao que tudo indica também era o pai
do menino. O curta não tem diálogo, mas consegue entregar a mensagem de forma muito eficiente, além da paleta de cores ser bem anos 80 mesmo com tons como vermelho, verde neon e amarelo super carregados
nas cenas, além da trilha sonora com sintetizador. Acho que além do conto da mulher na banheira, este aqui é o outro único que aborda violência física/sexual e de uma forma tão crua e direta que chega a incomodar.
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Z é de Zetsumetsu (Extinção):
E tinhamos de terminar com um curta japonês que sinceramente, não foi muito melhor que os antecessores dessa lista. Pela segunda vez nesse filme vemos aquele simbolo famigerado da segunda guerra mundial,
uma sequência pseudosexual muito ridícula e excesso de nudez feminina desnecessária, além de um assassinato em que a personagem é golpeada por algo pontiagudo na vagina, eu sei a cena descrevendo assim
parece perturbadora e chocante, mas acredite, vendo o curta, tudo fica extremamente ridículo e caricato e ao mesmo tempo que isso está acontecendo em um lugar, em outro lugar do prédio, uma moça é atacada
por criaturas.
Em paralelo a essas bizarrices, tem esse homem japonês numa cadeira de roda falando coisas muito desconexas e críticas aos Estados Unidos.
Vou ser sincera aqui, os dois curtas japoneses anteriores, por mais ridiculos que fossem, ainda tentavam dar alguma ideia de que havia uma história, por mais bizarra que fosse,mas esse aqui nem se esforçou.
Tem uma cena em que uma mulher com o corpo parcialmente queimado (e nua, claro) luta com uma pseudo nazista (também nua da cintura para cima) cuja arma é um enorme penis sintético da ponta do qual sai uma
espada retrátil. (fez sentido pra você? Pois é, nem pra mim). E a cena final em que o cadeirante fica em pé,exibe uma ereção e goza arroz, que suja a tela e então com um circulo vermelho no meio forma a bandeira do Japão, foi o auge da bizarrice.
Não tem como defender, não é um curta "de arte" é so um monte de gente pelada e insinuações sexuais super porcas.
Curiosidade: Quando fui procurar quem era o diretor, descobri que é o Yoshiro Nishimura, que produziu pérolas doentias como "Tokyo Gore police" "Meatball machine girl" e o bizarríssimo "Robo Gueisha". Mesmo assim,
devia haver diretores melhores e menos bizarros para convidar para a antologia.
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Ufa, chegamos ao fim dessa viagem dos horrores. Foi muito exaustivo escrever 26 analises dos curtas, mas está aqui e espero que você tenha gostado. Não sei se vou analisar a parte 2, que saiu uns anos depois, porque só essa aqui já foi o bastante
pra embrulhar meu estômago por algumas semanas.
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