Prevenge
Sabe aquele negócio de você passar na frente de uma certa prateleira no supermercado um milhão de vezes, pensando se leva ou não certo produto? Então, aconteceu isso comigo com esse filme, eu pensei e pensei muito antes de enfim resolver baixar ele para assistir.
A sinopse também não ajudava muito, dizia ser uma comédia de terror e pelo que eu sei, esses dois gêneros não costumam combinar muito bem.
Mas eis que enfim eu tirei um tempinho e olha, foi um filme que eu terminei de ver e fiquei com opiniões bastante conflitantes, gostei de alguns pontos, inclusive a abordagem narrativa, que vai nos dando informações do passado da personagem em doses homeopáticas e me impliquei com outros.
O filme conta a história de Ruth, ela está gravida de sete meses e espera uma menina. Até ai tudo normal. Mas aqui está o diferencial do enredo, a bebê lhe diz para matar certas pessoas. Sim, você não leu errado, o feto fala com a mãe, o feto cita As Fúrias de Ésquilo e tem uma postura bastante misândrica e agressiva contra os homens.
Logo nos primeiros minutos do filme vemos Ruth matar friamente um homem dono de uma loja de lagartos e animais exóticos. O modus operandi dela é fazer um único corte na jugular com uma faca de cozinha.
Ela usa de artifícios como nomes fictícios e todo tipo de acessório e maquiagem para se disfarçar. E apesar de ser totalmente violenta e calculista com a vítima escolhida, consegue ser terna e gentil com outras pessoas relacionadas. Como por exemplo, e uma das cenas ela mata um homem arrancando seus escrotos com um golpe de faca e logo em seguida, escolta a mãe dele, que tem Alzheimer, de volta para a cama, a cobre e lhe dá um beijo de boa noite. Ou seja, podemos ver que ela tem total noção de quem ela deve e quem não deve machucar.
Confesso que a frieza da personagem em mutilar as vítimas me causou certo desconforto, mas, aos poucos quando os motivos por trás do massacre foram surgindo, eu comecei a compreender, não que tenha simpatizado ou concordado, mas passei a entender o que a levou a fazer isso. Correção, o que levou a bebê a fazê-la fazer isso.
E como toda boa grávida, entre as matanças, Ruth vai a obstetra, da qual a bebê não gosta e deixa isso bem claro em sua voz aguda e nada infantil. Esse foi um dos detalhes que me incomodou, a voz que é para ser da criança parece uma coisa modificada num sintetizador elétrico, quase inumana, como uma espécie de possessão demoníaca. E em flashes descobrimos que ela ficou viúva recentemente e desamparada, passa a dar crédito a voz que escuta e acredita ser da bebê.
Uma das coisas mais bizarras do filme é o “livro do bebê” que Ruth mantem, onde, ao invés de registrar as conquistas da criança, ela escreve sobre cada uma das pessoas que matou, como e quando, com direito a perturbadores desenhos e tudo. E ela não se intimida de registrar seus novos abatimentos no livro, independente de onde ou perto de quem esteja.
O filme que tem aproximadamente 1h30 acompanha Ruth em sua cruzada vingativa motivada (pelo que ela acredita ser) o bebê em sua barriga, culminando com a perseguição da sua ultima vítima numa festa de Halloween e somente quando ela se depara com a informação de que a esposa da ultima vítima também está grávida e vacila em executar seu plano, entrando em fim em trabalho de parto.
A narrativa é respeitosa com o estado mental delicado da personagem, que por conta de alguns acontecimentos anteriores a gravidez, a fizeram ter uma espécie de surto dissociativo que culminou na alucinação de ouvir a voz do bebê.
Não o classificaria como um filme de comédia, talvez um filme de humor negro, com certeza, mas não de comédia, porque por mais absurdo que o tema possa parecer, apresenta uma personagem psicologicamente transtornada e que só depois que finalmente dá a luz, se dá conta de que foi ela a responsável pelos assassinatos, tomada pelo desejo de vingança.
As caras e bocas que a atriz faz, são um detalhe a parte, são bastante teatrais e exageradas, mas transmitem exatamente os sentimentos de raiva, frustração e desejo de vingança que a personagem pretende passar.
Enfim, foi um filme que me causou sentimentos dúbios, como eu disse, gostei da premissa, porque se pararmos para analisar, não são poucas as grávidas que sofrem de algum tipo de instabilidade psicológica durante o período de gestação, somado ao fator de que ela está sozinha, desamparada e sedenta por vingança.
É um filme pra se assistir sem esperar que a lógica dê as caras, inclusive a cena final não faz total sentido, pois fica a interpretação do espectador o que aconteceu. Recomendo para quem gosta de filmes alternativos e de humor negro, com um bocado de sangue, assassinatos, alucinações auditivas e uma grávida homicida.
Curiosidades:
O título “Prevenge” é uma mistura de duas palavras do inglês “Pregnant” = Grávida e “Revenge” = vingança.
A atriz que interpreta Ruth, Alice Lowe que dirigiu, atuou e roteirizou o filme, estava realmente grávida durante as filmagens.
A bebê que aparece no final do filme como filha de Ruth, é filha de Alice Lowe.
O filme que é considerado um terror indie, teve um baixíssimo orçamento e contou com um elenco bastante limitado.
O filme ganhou 02 premiações. Screen International’s Rising Star Award e Jury Prize. E foi indicado a mais 7 premiações.
Interessou? Baixe Aqui
***
“Crianças hoje em dia são tão mimadas. Dizem, mamãe, eu quero um Playstation. Mamãe, eu quero que mate aquele homem.”
Comentários
Postar um comentário